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“Saldos” Tesla: como enfrentar a nova dinâmica do mercado automóvel?

Estou longe de ser um “Tesla fanboy” mas admiro o caráter disruptivo da marca. Aprecio principalmente as oportunidades que este OEM cria para a indústria avançar, mesmo quando da sua parte há erros, falhas e atrasos. Vale a pena estudar a estratégia de pricing da Tesla e contextualizá-la na fase pela qual a indústria automóvel está a passar. Acredito que há aqui oportunidades a explorar... Venha daí!

 

Ricardo Oliveira

World Shopper | Viver Elétrico

Formação em mobilidade elétrica

 

A evolução dos acontecimentos

No início de 2023 a Tesla reduziu, em média e a nível global, os seus preços em 15%. Esta estratégia surpreendeu a indústria e o mais fácil foi concluir que a Tesla estava com dificuldades para escoar a sua produção. O que nem seria surpreendente, considerando que se trata de uma marca que comercializa essencialmente 2 modelos, um dos quais com 7 anos.

Regressemos a 2022. No terceiro trimestre, a Tesla alcançou uma margem operacional de 25%. No quarto trimestre este resultado passou para 24%. Tudo isto num segmento onde a maior parte dos seus concorrentes ainda está a tentar fugir de margens negativas.

Chegados a 2023 surge a tal redução, média e a nível global, de 15% nos preços. No primeiro trimestre do ano notou-se imediatamente o impacto na margem operacional da Tesla, que passou de 24% para 19,3%. Os cerca de 5% de redução nesta margem por comparação com a queda de 15% nos preços sugerem que também houve uma diminuição dos custos de produção.

Para se ter uma ideia da dimensão da competitividade atual dos preços da Tesla, esta marca conseguiu colocar os seus modelos do segmento D a preços do segmento B (BEV). É evidente que nem todas as pessoas adoram Tesla e que o modelo está cada vez mais vulgarizado... mas a comparação é inevitável!


Aceleração fulgurante

Em 2022 a Tesla vendeu globalmente 1,3 milhões de unidades e em 2023 prevê vender 2 milhões. Isto significa acrescentar ao volume de 2022 da Tesla o volume total anual de algumas marcas (cerca de 700.000 unidades). Para se ter uma ideia da aceleração da Tesla, há 5 anos atrás este OEM produziu cerca de 245.000 unidades, entre todos os seus modelos. No primeiro trimestre de 2023, só o Model Y, com 267.200 unidades, foi o automóvel mais vendido do mundo, independentemente do tipo de propulsão. Em segundo lugar ficou o Toyota Corolla, com 256.400 unidades, um modelo verdadeiramente global.

Num mundo completamente diferente, na era da combustão e sem internet, houve marcas que demoraram 100 anos para atingir volumes na ordem das 700.000 unidades. Para as organizações que viveram o ritmo anterior de crescimento, ainda se torna mais difícil a adaptação à intensidade da evolução atual. Mas difícil não é impossível!

Considerando que a Tesla vive numa realidade diferente dos outros OEM, será legítimo analisar a sua estratégia de preços à luz de outros pressupostos? Venha daí até à China...




O que esperar da China?

Os “saldos” da Tesla também tiveram consequências no maior mercado automóvel do mundo. Em outubro 2022, a marca norte-americana iniciou uma redução de preços na China que se prolongou até janeiro de 2023. Em determinados casos, os Tesla comercializados na China chegaram a ser 50% mais baratos do que os modelos equivalentes, nos Estados Unidos e na Europa. Esta situação colocou sob pressão os OEMs locais que, rapidamente, lançaram agressivas estratégias de exportação.

Os construtores chineses têm atualmente uma vantagem de cerca de 10.000 euros nos custos de produção de BEVs, face aos seus concorrentes europeus. Isto coloca as marcas chinesas em excelente posição para explorar os mercados ocidentais, principalmente nos segmentos BEV de acesso.

Para se ter uma ideia do potencial da China na produção de automóveis elétricos, considerem-se os seguintes dados: a China controla 41% da mineração mundial do cobalto e 28% no caso do lítio; o país refina 73% do cobalto mundial e 67% do lítio; produz 82% dos electrólitos, 74% dos separadores, 77% dos cátodos e 92% dos ânodos; a China produz 66% das células de baterias e 54% dos BEV, sempre a nível mundial; até 2030, a China fabricará mais do dobro de baterias do que todos os outros países juntos.

“Ninguém poderá ter sucesso nos veículos elétricos sem ter algum tipo de cooperação com a China, direta ou indiretamente”, afirmou recentemente Scott Kennedy, um reputado analista da CSIS.


O que ganhou a Tesla com esta estratégia? O que fazer?

Aparentemente, a estratégia de reposicionamento de preços da Tesla veio acelerar uma tendência que se “via chegar”: o abrandamento geral da procura e a retoma progressiva da oferta no setor automóvel iriam, mais tarde ou mais cedo, provocar uma redução de preços. O que ganhou a Tesla em acelerar este processo? Primeiro, esta marca já demonstrou que reage bem e rapidamente a cenários desafiantes, o que nem sempre é o caso dos OEM tradicionais, lastrados pela inércia do “negócio a combustão”. Segundo, ao criar pressão nos preços, a Tesla beneficia das superiores margens que dispõe no “negócio elétrico”. Basicamente, com esta antecipação, a Tesla criou um cenário para o qual está melhor preparada do que os seus concorrentes.


Para o bem e para o mal esta é a nova realidade do mercado automóvel, dos segmentos premium ao mainstream, independentemente da energia de propulsão. É um mundo exponencialmente acelerado pela evolução tecnológica, onde é preciso agir bem, depressa e de forma criativa. Aparentemente estamos a entrar numa fase em que os OEM terão que “ler”, melhor do que nunca, as tendências do mercado e atuar rapidamente. A comunicação é crucial e até o próprio Elon Musk já admite fazer um “pouco de publicidade” tradicional para difundir a competitividade dos seus preços! A gestão de preços terá que ser ainda mais “fina”, com ajustamentos, para baixo ou para cima, em função de vários critérios. Uma certeza: não vale a pena esperar para ver o que vai acontecer à Tesla… quando o resultado chegar, vai ser tarde demais!


Fontes: Car Sales Statistics, Autovista24, Automotive News, NY Times


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